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domingo, 21 de outubro de 2007

A rua

Chovia muito e o vento frio prenunciava a chegada do inverno.
Abrigado sob uma marquise de uma loja, fujo dos pingos da chuva, e, quando me dou conta, me vejo em uma ruazinha com ares de passado...
É tarde e as poucas lojas ajeitadas em seus prédios antigos, já estão fechadas, a cidade começa a morrer e tudo vira sombra e silêncio quando anoitece...
Nos paralelepípedos já gasto de tantos passantes, reflexos das luzes de mercúrio e o brilho dos faróis dos poucos carros, vindo de não sei onde e indo pra onde só eles sabem...
Num canto escuro, próximo a um prédio condenado, sacos de lixos amontoados, são disputados por cães, gatos e um mendigo barbudo, com várias roupas sobrepostas e um saco plástico transparente sobre tudo, completando sua esdrúxula figura, garimpando algum resto da comida de alguém.
A chuva não cessa, apenas os passos diminuem; um ou outro par de pernas passa apressado, oculto sob negros guarda-chuvas ou sombrinhas multicoloridas.
Um rosto se ilumina pela brasa do cigarro num canto escuro do outro lado da rua, é uma moça muito maquilada e de roupas extravagantes, recostada em uma parede embolorada, de olhares insinuantes, traga a fumaça, soltando em seguida uma fina névoa por entre os lábios voluptuosos...
Surgem outras, espectros sensuais saem de cantos úmidos, esgueirando-se lânguidas...
Esta viela, aqui, esquecida, quase engolida por prédios colossais e pelo asfalto negro, perdida neste presente antropofágico, infestada de lojinhas e placas coloridas, com seus prédios sem vida, apáticos, vendo a cidade crescer, ainda conserva resquícios do tempo em todos se cumprimentavam nas ruas e andavam devagar, com damas e senhoras pudicas de passinhos curtos, desfilavam ao lado de austeros senhores...
Hoje mendigos famintos e prostitutas amargas se acotovelam em suas calçadas, ávidos do prazer capitalista.
Apenas o pingos das calhas é ouvido e da chuva na calçada, nenhum carro, nenhuma conversa, ninguém; sinto os dedos dos pés congelarem.
O mendigo espalha o lixo e pragueja irritado, pantomímico, gesticula para alguém...
quiçá converse com a rua.
Um automóvel se aproxima, encosta perto de uma das prostitutas, ela se curva na janela no carro, trocam algumas palavras, entra no veículo e partem...
A chuva dá uma trégua, sacudo a preguiça, saio de meu esconderijo e agora sou eu quem parte em direção ao meu destino.
O vento frio castiga, corta o rosto como navalha, dou um última olhada pra ruazinha e a deixo com seus estranhos habitantes...
Sinto vontade de dar adeus...

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